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Descobri que há diferença [homérica] entre fazenda e “roça”. Férias sem dinheiro e aí vem a pergunta: “Pra onde vamos? Ahhhh... Estava pensando em irmos visitar aquela tia que mora no interior, faz tempos que não a vemos e nunca fomos lá. Um passeio bem ecológico e gastando pouco.” Pronto, resolvido o problema, agora é pegar a estrada. E aos trancos e barrancos chegamos ao “Oco dentro”.
O casarão era antigo e velho, e logo avistamos tia Genoveva na porta querendo saber quem estava chegando por ali. Abraços, afagos, notícias de cá e de lá, água no feijão, cachorro pegando uma galinha para o almoço, cafezinho torrado e moído na hora. Maravilha!
Vontade de fazer xixi e tive que perguntar:
-Onde fica o banheiro tia Genoveva?
-Num tem! Se é pras necessidades, vai aí pros fundos que encontra lugar bão pra se aliviar e se for pra tomar banho é na “chorra da bica” - E me entregou rolo de papel higiênico. Bem ecológico mesmo!
Depois do banho gelado na cachoeira da bica [sai dura do banho, odeio água fria no lombo], hora de jantar, prosear mais um pouco e procurar o “ninho” conforme dizia minha tia Genoveva. A luz era oferecida por lamparinas alimentadas à querosene e eu quase não enxergava nada. Havia levado um livro para ler à noite e meu notebook para enviar notícias para os familiares. Sonhei alto mesmo...
Todo mundo deitado em catres. Eu e meu amor num catre com colchão de capim, duro que nem chão, mas uma beleza pra coluna né? Depois da chama da lamparina apagada, algo começou um voo pelo quarto. Tinha um passarinho preso ali.
-Amor abra a janela pra esse passarinho sair tadinho, parece desesperado. Acende a lamparina pra eu ver o coitadinho.
-Hummmmmmm... Deixa ele ai mesmo, se quiser ele sai pelos caibros... Melhor você não ver! Procure dormir...
Eu estava cansada e acabei dormindo mesmo com o passarinho dando voos rasantes sobre minha cabeça. O galo cantou uma infinidade de vezes, e ao longe outros galos respondiam. As vacas mugiam no curral e meu tio ainda saiu de madrugada para ordená-las. Levantei assim que senti o cheirinho do café e pra minha surpresa todos já haviam se levantado.
Meu filho pediu a benção assim que me viu entrar na cozinha:
-Benção mamãe! Você viu que está toda “cagada”?
Embirrei na parede! Que vexame... Comecei a gaguejar e procurar desculpas para tal atrocidade:
-Deve ter sido o leite puro que tomei ontem à noite...
-Mãaaaaaae, está cagada de morcego! – E caiu na risada.
-Morcego? Como assim?
-No meu quarto tinha uns dois voando. Eu como sei que são cagões, cobri até a cabeça – Ele disse com os olhos dançando de prazer em dizer aquilo.
Virei brava para meu marido, pois ele sabia que aquele “passarinho” era um morcego e não me disse nada.
-Você sabia e me deixou acreditar que esse “vampiro de animais” era um passarinho perdido! Ele podia ter mordido meu pescoço e sugado meu sangue e mesmo assim não disse nada!
-Se eu dissesse você ia ficar a noite toda acordada, e aí sim ia ser um “cagaço”[que linguajar esse meu Deus, eu uma lady rsrsrsrs]. Então melhor ser defecada por morcego não é?
Logo depois do café da manhã, eu pedi pra voltarmos pra casa, não pela privada inexistente, ou mesmo um chuveiro com água morna, mas pelos morcegos sem educação nenhuma, pelos sapos que tropecei quando fui ao “mato” à noite [pelas cobras que sempre estão atrás deles], pelas onças que eles diziam estarem rondando por perto atrás das reses... E ainda tinha o caso da sucuri que “engoliu um boi uns diinhas desses.”
Sem dinheiro, sem férias, mas vivinhos... Descobri a larga distância ecológica entre fazenda e roça.
Marly Bastos